Entre
receitas vultosas e gargalos estruturais, equilíbrio entre custeio e
investimentos testa limites municipais
Por REDAÇÃO do Jornal DM News | Siga nas Redes Sociais
Na
audiência pública realizada na manhã desta terça-feira (30) na Câmara Municipal
de Uberaba, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) detalhou sua execução
financeira de janeiro a agosto de 2025. As receitas da pasta somaram R$ 439,2
milhões, enquanto as despesas liquidadas chegaram a R$ 421,97 milhões — um
saldo aparentemente confortável, mas que revela pressões e prioridades que
merecem análise mais técnica.
Dos
recursos declarados, 35,74% advêm da União (R$ 156,98 milhões) e 12,95% do
Estado (R$ 56,86 milhões). Apenas 0,11% provêm de repasses dos municípios da
macrorregião (R$ 473,9 mil). A maior fatia — 51,21% (R$ 224,9 milhões) —
corresponde à contrapartida da própria Prefeitura de Uberaba.
Essa
configuração evidencia a forte dependência do município sobre sua própria
arrecadação para sustentar a saúde local. Em termos comparativos, boas práticas
e normativas do SUS e da Lei Complementar 141/2012 prescrevem que gestores
devem buscar maior equilíbrio entre fontes federal, estadual e municipal, para
não sobrecarregar o orçamento local com custos que deveriam ser compartilhados.
Das
despesas liquidadas, 61% (R$ 257,4 milhões) foram consumidos na assistência de
Média e Alta Complexidade (MAC) ambulatorial e hospitalar, enquanto 39,60% (R$
167,1 milhões) corresponderam a gastos com pessoal. Vale observar que as
despesas com custeio entre manutenção e estrutura foram estimadas em R$ 246
milhões (58,31%) — um dado que evidência que boa parte dos recursos auxilia no
funcionamento rotineiro das unidades. Por outro lado, os investimentos —
essenciais para expansão, modernização e recuperação de infraestrutura —
absorveram apenas R$ 8,8 milhões (2,08%).
Essa baixa
participação de investimento é um ponto crítico: municípios com forte carga de
custeio e pessoal tendem a comprometer a sustentação futura dos serviços de
saúde. O desafio é encontrar margens para investir sem sacrificar atendimento
contínuo.
A SMS
relatou redução na fila de consultas: de 25.303 para 23.488 pacientes — queda
de 7,2% entre o primeiro e o segundo quadrimestres de 2025. O total de exames
em fila também caiu 10,4%, de 57.669 para 51.674. Algumas especialidades
mantiveram “fila zerada” (Cabeça e Pescoço, Endocrinologia, Genética etc.), um
dado louvável.
Contudo, a
especialidade de Urologia registrou acréscimo de 25 pacientes na fila, embora
com promessas de atendimento em setembro. Esse tipo de variação revela que,
apesar do esforço no controle das filas, ainda há fragilidade na gestão da
demanda e nas previsões de capacidade de atendimento.
O aumento
da demanda por ultrassonografia foi destacado pela SMS, que planeja mutirões
com prestadores contratados e já agendou 4.707 vagas. Esse planejamento
“reativo” aponta uma prática comum: gestores reorganizam-se em função da
pressão crescente, mas nem sempre antecipam investimentos em equipamentos ou
parcerias para evitar gargalos futuros.
As
manifestações dos usuários via Ouvidoria foram majoritariamente por telefone —
82,54% no primeiro quadrimestre e 87,22% no segundo. O atendimento presencial
caiu de 14,07% para 9,21%, enquanto e-mail representou cerca de 3–3,5%. Esse
comportamento sinaliza duas tendências: a digitalização crescente do
relacionamento cidadão-governo, e a possível insatisfação de usuários que não
conseguem atendimento presencial.
.
Análise técnica: limites e oportunidades
1.
Gasto com pessoal: A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) limita os gastos com pessoal
para evitar desequilíbrios orçamentários. Segundo estudo da CNM, o limite
máximo é 54% da Receita Corrente Líquida (RCL) para o Executivo municipal,
sendo que 95% desse teto (≈ 51,3%) já é considerado “prudencial”. percentual de
39,6% que Uberaba registra no âmbito da SMS parece confortável, mas é
importante observar a soma com outras áreas municipais, pois eventual
extrapolação pode comprometer reajustes, novas contratações ou reestruturações.
2.
Baixo investimento: O percentual de apenas 2,08% voltado a investimentos revela que os
próximos anos serão desafiadores se infraestrutura e modernização forem
deixadas de lado. Sem ampliação da rede ou atualização tecnológica, o fluxo
assistencial poderá saturar.
3.
Dependência da arrecadação
municipal: Contrapartidas elevadas oneram o orçamento
da prefeitura, limitando a flexibilidade fiscal para outras áreas prioritárias
(educação, saneamento etc.).
4.
Gestão da demanda e
previsibilidade: A capacidade de projeção de fluxos de
consultas e exames precisa ser fortalecida. O modelo de mutirões, embora útil,
não substitui investimentos contínuos e estrutura permanente.
5.
Transparência e controle
social: cumprindo a Lei Complementar 141/2012, é
obrigatório prestar contas com relatórios detalhados e participação do conselho
de saúde. Em Uberaba, a audiência pública e a divulgação do relatório no Portal
da Transparência são práticas que fortalecem a legitimidade da gestão.
A prestação
de contas da SMS demonstra avanços no controle das filas e na execução
orçamentária, mas evidencia fragilidades estruturais que não podem ser
ignoradas. O equilíbrio entre custeio e investimento é o calcanhar de Aquiles
de muitas secretarias municipais de saúde. Uberaba precisa consolidar
estratégias de médio prazo: fortalecer a atenção primária, descentralizar
ofertas de exames, modernizar infraestrutura e buscar novas fontes de receita
federativa e estadual.
Somente com
visão de futuro e comprometimento técnico será possível transformar os números
atuais em serviços de saúde sustentáveis e dignos.







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